Cavaleiro de Itararé
Poema de Raul Bopp
Imediações de Itararé. Diz que há visagens
que se escondem atrás das taipas.
De noite, às vezes,
aves assustadas piam.
Há qualquer coisa de estranho no ar tranquilo.
A faixa do mato para na ponte
por onde passa
o cavaleiro de Itararé.
O fantasma quando vem chega de longe.
Corta o muro do cemitério.
Vem a trote. A galope. O cavalo relincha.
O duende apeia. Batem os estribos. Abrem a porta.
Vai-se ver quem é?
Não é ninguém.
Entra a desgraça pela casa adentro.
A mãe adoece. A filha foge. Secam as lavouras.
O filho caçula foi mordido de cobra.
Chamam as carpideiras.
Vêm de carroça com xales negros. Trazem pacotes de amuletos.
Defumam os quartos
com galhinhos de alecrim.
Depois começa o choro:
- Ai Nossora (Nossa Senhora)
e espremem os “ai-ais” cortados de soluços.
Fazem sinal da cruz de vela acesa na mão.
Gargarejam 100 Ave-Marias.
No fim de cada oração
atiram uma pedra pela janela afora
para espantar malefícios.
Diz-que o Diabo de rabo sujo sai correndo.
Fuça monturos.
Esfrega-se como doido nos espinhos. Sangra a pele.
E então vira cachorro.
Fonte: "Poesia completa de Raul Bopp", José Olympio Editora, 2014.
Originalmente publicado em: "Cobra Norato e outros poemas", Dau al Set, 1954.