O ressuscitante
Poema de Cecília Meireles
Meus pés, minhas mãos,
meu rosto, meu flanco,
- fogo de papoulas!
E hoje, lírio branco!
E hoje, lírio branco!
Pela minha boca,
por minhas olheiras,
- arroios partidos!
E hoje, albas inteiras!
E hoje, albas inteiras!
Eu era o guardado
de sinistras covas!
E hoje visto nuvens
cândidas e novas!
Vi apodrecendo,
com dor, sem lamento,
meu corpo, meu sonho
meu corpo, meu sonho
e meu pensamento!
E hoje, sou levado
por entre as caídas
coisas, - transparente!
(Aroma sem nardo!
Fuga sem violência!)
E de cada lado
choram doloridas
mãos de antiga gente.
Fonte: "Obra poética", Editora Nova Aguilar, 1983.
Originalmente publicado em: "Vaga Música", 1942.