A mata

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Poema de Manuel Bandeira



A mata agita-se, revoluteia, contorce-se toda e sacode-se!
A mata hoje tem alguma coisa para dizer.
E ulula, e contorce-se toda, como a atriz de uma pantomima trágica.

Cada galho rebelado
Inculca a mesma perdida ânsia.
Todos eles sabem o mesmo segredo pânico.
Ou então - é que pedem desesperadamente a mesma instante coisa.

Que saberá a mata? Que pedirá a mata?
Pedirá água?
Mas a água despenhou-se há pouco, fustigando-a, escorraçando-a, saciando-a como aos alarves.
Pedirá o fogo para a purificação das necroses milenárias?
Ou não pede nada, e quer falar e não pode?
Terá surpreendido o segredo da terra pelos ouvidos finíssimos das suas raízes?

A mata agita-se, revoluteia, contorce-se toda e sacode-se!
A mata está hoje como uma multidão em delírio coletivo.

Só uma touça de bambus, à parte,
Balouça... levemente... levemente... levemente...
E parece sorrir do delírio geral.




Fonte: "Antologia Poética", Editora Nova Fronteira, 2001.
Originalmente publicado em: "O ritmo dissoluto", 1924.