Felicidade

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Poema de Gilka Machado



Felicidade
de não ter nada meu
e escancarar, com as mãos vazias,
as janelas aos dias,
agradecendo aos céus esta riqueza
da minha super-sensibilidade
para a beleza,
para a bondade.

Felicidade
ridícula talvez, talvez insana,
de recalcar tudo que me consome,
de distrair minha própria fome
com a fome de matar a fome humana.

Felicidade
(que é meu orgulho certamente vão),
de, em versos, me haver dado inteira à humanidade,
na impossibilidade
de ser pão.

Felicidade
de vir chegando à maturescência
nesta paz absoluta de consciência,
sem amargura e sem saudade.

Felicidade
deste sereno adeus, ao sonho que se evade
desta renúncia àquilo que mais quis!

Felicidade
de sem remorso olhar a dor que infelicita
a humanidade aflita...

Felicidade
de ter sabido ser sempre tão infeliz.




Fonte: "Sublimação", Editora Typo Baptista de Souza, 1938.
Originalmente publicado em: "Sublimação", Editora Typo Baptista de Souza, 1938.