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Poema de Gilka Machado



Tudo quanto é macio os meus ímpetos doma
e flexuosa me torna e me torna felina.
Amo do pessegueiro a pubescente poma,
porque afagos de velo oferece e propicia.

O intrínseco sabor lhe ignoro; se ela assoma,
no rubor da sazão, sonho-a doce, divina!
Gozo-a pela maciez cariciante, de coma,
e o meu senso em mante-la incólume se obstina.

Toco-a, palpo-a, acarinho o seu carnal contorno,
saboreio-a num beijo, evitando um ressabio,
como num lento olhar te osculo o labío morno.

E que prazer o meu! que prazer insensato!
- pela vista comer-te o pêssego do lábio,
e o pêssego comer apenas pelo tato.



Fonte: "Estados de Alma", 1917.
Originalmente publicado em: "Estados de Alma", 1917.

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