Quadras populares 701 a 720
Poema anônimo
701
O anú é passo preto.
Passarinho de verão;
Quando canta à meia noite
Ó que dor no coração!
(Passo = Pássaro)
702
O anú é passo preto
E tem o bico rombudo;
Fala mal da vida alheia,
Já passa de linguarudo.
703
O senhor não arrepare
Esse meu pouco saber;
Pois eu sou menino e moço,
Tô no tempo de aprender
704
O cravo também se muda
Do jardim para o deserto:
De longe também se ama,
Não podendo amar de perto.
705
O senhor não arrepare
Esse meu cantar baixinho,
Que eu sou muito vergonhoso,
Não posso cantar sozinho.
706
Olha que lua tão clara,
Meu amor não aparece;
Veja se não é pecado
Enganar a quem padece.
707
Os teus olhos e os meus
Têm o mesmo parecer:
Mas os teus têm um jeitinho
Que põem os meus a perder.
709
Ó senhora mãe da noiva
Saia fora do fogão:
Venha ver a sua filha
Nas unhas de um gavião.
Saia fora do fogão:
Venha ver a sua filha
Nas unhas de um gavião.
710
Ó minha senhora dona,
Quem pergunta quer saber:
"Saindo daqui agora,
Onde irei amanhecer?"
711
O tatu era bem pobre
E não tinha nada seu:
Só tinha uma casa velha
Que o defunto pai lhe deu.
712
O tempo, que tudo gasta,
Gasta o ferro, o bronze, a vida;
Somente gastar não pode
A saudade desabrida.
713
O vem-vem está cantando
No olho da oiticica;
Cala a boca, passarinho,
Quem se mata morto fica.
714
O cachorro está latindo
Lá pras bandas do chiqueiro;
Cala a boca, cachorrinho,
Não sejas mexeriqueiro.
7 15
Ouço tropel de cavalos
E ouço argolas tinir;
Parece ser meu benzinho
Que já vem se despedir.
716
O pinto belisca o velho,
O velho salta pra trás;
As meninas vão dizendo:
"Dinheiro, tomara eu mais."
717
Parece troça, parece,
Mas é verdade patente
Que a gente nunca se esquece
De quem se esquece da gente.
718
"Paulista, de onde é que vem?"
"Eu venho do Sincorá."
"Paulista, você se apeie
Que o café mandei coá."
719
Peixe do mar, que não fala,
Também morre pela boca:
Hei de dizer minhas penas
Até que a voz fique rouca.
720
Para conter os meus males
Meu natural me contém;
As sepulturas têm flores,
A minha vida não tem.
Fonte: "Mil quadras populares brasileiras", Briguiet e Cia. Editores, 1916.
Originalmente publicado em: "Mil quadras populares brasileiras", Briguiet e Cia. Editores, 1916.