Versos a um cão
Poema de Augusto dos Anjos
Que força pode, adstrita a embriões informes,
Tua garganta estúpida arrancar
Do segredo da célula ovular
Para latir nas solidões enormes?!
Esta abnóxia inconsciência em que tu dormes
Suficientíssima é para provar
A incógnita alma, avoenga e elementar,
Dos teus antepassados vermiformes.
Cão! - Alma de inferior rapsodo errante!
Resigna-a, ampara-a, arrima-a, afaga-a, acode-a
A escala dos latidos ancestrais.
E irá assim, pelos séculos adiante,
Latindo a esquisitíssima prosódia
Da angústia hereditária dos seus pais!
Fonte: "Eu", Edição do Autor, 1912.
Originalmente publicado em: "Eu", Edição do Autor, 1912.