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Poema de Eduardo Guimaraens
Por que, depois de tanto ardor, de tanto sonho,
depois de tanta solidão,
fazes com que se vale o meu olhar tristonho,
cheio de angústia e de paixão?
Por que buscas, de novo, entristecer-me a face
como se nada houvesse em mim
que esperasse por ti, que só por ti sonhasse,
e que por ti sofresse, enfim?
Sou, por acaso, o insone exilado da sorte,
o doloroso desertor
da alegria, o valete amoroso da morte,
o enfermo exânime do amor?
Ou és tu, por acaso, a insensível Sibila
que, em vão, o peregrino êxul
interrogou, à sombra esplêndida, que oscila,
de um mistério feito de azul?
Seremos sempre assim? Que sombrio ditame,
sobre a minha alma ainda fiel,
ordena que eu te queira e te procure e te ame,
a ti que és pálida e cruel?
Obriga-me a sorrir quando o teu gesto frio,
súbito, gela a minha voz?
Dá-me o desejo de morrer quando sorrio
e a noite desce sobre nós?
Quero-te assim, porém! É justo o meu tormento.
Faze-me sempre assim sofrer!
E eu morrerei por ti, sorrindo ao sofrimento,
se um dia, enfim, o amor morrer!
Fonte: "A divina quimera", digitalização de Marco Antonio Rodrigues ,2006.
Originalmente publicado em: "A divina quimera", Tipografia Apollo Vieira da Cunha & Cia, 1916.