Retrato sobre a cômoda

Imagem de Mário Quintana

Poema de Mario Quintana



Ah! esses quadros de antanho
quase tão horríveis como a palavra antanho...
não de um horrível ridículo mas de um horrível
triste,
porque se pode ver entre o vidro e o retrato
uma folha outrora verde, uns cabelos que já foram
vivos
e agora para sempre imóveis na moldura negra
e, na fotografia, alguém está sorrindo eternamente
quando um sorriso, para ser sorriso, devia ser
efêmero...
Lá fora é uma tarde fin de siêcle, uma tarde
outoniça que parece
tirada da gaveta desta cômoda
....e, nas cartas antigas, também o amor amarelece.



Fonte: "Poesia Completa", Editora Nova Aguilar, 2006.
Originalmente publicado em: "Apontamentos de história sobrenatural", 1976.