O pombo
Poema de Silva Alvarenga
O meu pombo, a quem amava,
Igualava ao branco arminho:
Do seu ninho, oh desventura!
Que mão dura o foi roubar?
Na manhã clara e serena,
Se o achava dormitando,
O seu sono doce e brando
Tinha pena de turbar.
Que saudade me consome!
Ai de mim! Se me sentia,
O biquinho logo abria
Para a fome saciar.
O meu pombo, a quem amava,
Igualava ao branco arminho:
Do seu ninho, oh desventura!
Que mão dura o foi roubar?
Era manso, era amoroso
E as carícias conhecendo
Desejava estremecendo
Ser mimoso em agradar.
O receio já presago
Me dizia na floresta
Que o tornasse pela sesta
Com afago a visitar.
O meu pombo, a quem amava,
Igualava ao branco arminho:
Do seu ninho, oh desventura!
Que mão dura o foi roubar?
Glaura, oh céus! porque cedeste
A meus rogos? dize agora,
"Pobres dons duma pastora
Não quiseste conservar!"
Esta mágoa me atormenta,
E não sei como inda vivo;
Pois se busco lenitivo
Mais se aumenta o suspirar.
O meu pombo, a quem amava,
Igualava ao branco arminho:
Do seu ninho, oh desventura!
Que mão dura o foi roubar?
Não me alegra o doce encanto
Nem afino a curva lira,
Tudo sente e tudo inspira
O meu pranto, o meu pesar.
O destino por piedade
Me converta em pura fonte,
Porque possa neste monte
A saudade eternizar.
O meu pombo, a quem amava,
Igualava ao branco arminho :
Do seu ninho, oh desventura!
Que mão lura o foi roubar^
Fonte: "Obras Poéticas", B. L. Irmãos Garnier, 1864.
Originalmente publicado em: "Glaura: poemas eróticos", Officina Nunesiana, 1799.