Ilusão no amor
Poema de Joaquim Norberto de Sousa Silva
Amor, amor, doce existência
Do coração,
Quão grato és na terna ausência
Como ilusão!
Outros ai formam castelos
Ao vento, ao ar,
Os dias seus tornando belos
Com seu cismar.
Eu gozo amor! - Sonho acordado
Doce ilusão;
Então não sofre acobardado
Meu coração.
Então a vejo nestes braços
Sorrindo amor,
Qual entre o tronco em ternos laços
Imbé em flor.
Mulher gentil, eu - tão constante -
Sei adorar;
No coração do firme amante
Tem ela altar.
Ao lado seu eu experimento
Amor leal,
Mas só em mim - pois que lamento
Desdém fatal.
Se lhe dirijo os meus falares
Nada me diz;
No meu amor, nos meus olhares
Sou infeliz.
Vejo seus olhos cintilando
Mas sem ardor;
Vejo - nas faces risos brincando
Mas não amor.
Vejo - seu colo alabastrino
A palpitar;
Com o cabelo de ouro fino
Aura brincar.
Vejo - sim, vejo e esmoreço
Cheio de dor,
- Cheio de dor por que conheço
Não ser de amor.
Eu quero amar essa beleza
Mas não assim;
Quero-a também de amor acesa
E só por mim.
Quero - que seja a seu amante
Bem como a flor
Que desabrocha-se prestante
Ao beija-flor.
Quero - que seja ao caro vate
Firme no amar,
Como a rocha que não a abate
Em ira o mar.
Quero - que seja qual ser devera
Sem mais desdém,
Como fiel ao tronco a hera
Que o abraça e bem.
Quero - que seja mui constante
Sempre pra mim;
Quero - sim, te-la por amante
Tempo sem fim.
Porém em quanto desdenhosa
E esquiva for,
Quero a ilusão boa, enganosa,
Do meu amor.
Fonte: "O livro de meus amores", B. L. Garnier, 1848.
Originalmente publicado em: "O livro de meus amores", B. L. Garnier, 1848.