A Alcindo Palmerino
Toma a lira, Alcindo amado,
Neste prado a Glaura canta;
Ah! levanta a voz divina
E me ensina a suspirar.
Para ouvir-te o sol ardente
Fresca sombra nos procura:
O regalo não murmura
E a corrente faz parar.
Pelos ramos tortuosos
O silencio enfria as aves:
Brandos zéfiros suaves
Vem saudosos escutar.
Toma a lira, Alcindo amado,
Neste prado a Glaura canta;
Ah! levanta a voz divina
E me ensina a suspirar.
Se no bosque ou nas montanhas
Ruge a onça de ira acesa,
Tu lhe podes a fereza
E as entranhas abrandar.
Doce o som dos teus acentos,
Como o mel que a abelha cria,
Move a tosca penedia,
Onde os ventos vão quebrar.
Toma a lira, Alcindo amado,
Neste prado a Glaura canta,
Ah! levanta a voz divina
E me ensina a suspirar.
Aqui junto aos arvoredos
Deixa o pálido receio
E não temas do teu seio
Mil segredos arrancar.
Nestes campos, nestes vales
A calunia e o monstro fero...
Mas, ó céus! para que quero
Tristes males recordar.
Toma a lira, Alcindo amado,
Neste prado a Glaura canta;
Ah! levanta a voz divina
E me ensina a suspirar.
Inda os olhos mal enxutos
De sentir os teus amores,
Virão cândidos pastores
Tenros frutos te ofertar.
Virão ninfas da floresta
Loiras, brancas e formosas;
E trarão jasmins e rosas
Para a testa te enfeitar.
Toma a lira, Alcindo amado,
Neste prado a Glaura canta;
Ah! levanta a voz divina
E me ensina a suspirar.
Fonte: "Obras Poéticas", B. L. Irmãos Garnier, 1864.
Originalmente publicado em: "Glaura: poemas eróticos", Officina Nunesiana, 1799.