A saudade

Imagem de Adélia Fonseca

Poema de Adélia Fonseca



No meu seio uma flor d'esperança
Cultivei com desvelo perfeito;
Mas o rijo tufão da desgraça
Arrancou-me a florzinha do peito.

Ela foi 'n um abismo funesto
De cruel desengano cair,
E após veio a mais negra saudade
Com espinhos minh'alma pungir.

Tu ao menos, ó flor de infelizes,
Tu ao menos não me irás de deixar;
Se a desgraça plantou-te em meu peito,
D'ele mais te não pode arrancar.

Essas vãs alegrias do mundo,
Esses gozos que o mundo aprecia,
Eu os troco, saudade adorada,
Pela tua fiel companhia.

Enquanto eu existir, do martírio
Viverás, pra me dares a palma;
Se a ventura tentasse levar-te,
Levaria contigo minh'alma.

Tu ao menos, ó flor de infelizes,
Tu ao menos não me hás de deixar;
Se a desgraça plantou-te em meu peito,
D'ele mais te não pode arrancar.

Nem espero que mude meu fado;
E se atento em meu triste futuro,
Nele vejo - indizíveis angústias -
Um sepulcro cavando-me escuro!

Praza a Deus, que com tantos desgostos,
Minha pobre razão não arrefeça;
Que a saudade me não desampare
Nem seu doce motivo eu esqueça.

Sim, permite, Senhor, que em minh'alma
Ache sempre uma imagem querida,
Que, a despeito da sorte mesquinha,
Me atormente, encantando-me a vida.

Que essas vãs alegrias do mundo,
Esses gozos que o mundo aprecia,
Da saudade adorada eu os troco
Pela doce e fiel companhia.



Fonte: "Ecos da Minh'alma", Tipografia Camillo de Lellis Masson, 1866.
Originalmente publicado em: "Ecos da Minh'alma", Tipografia Camillo de Lellis Masson, 1866.