Lira XXVI (parte II)

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Poema de Thomaz Antônio Gonzaga



Não praguejes, Marilia, não praguejes
A justiceira mão que lança os ferros;
Não traz debalde a vingadora espada;
       Deve punir os erros.

Virtudes de juiz, virtudes de homem
As mãos se deram; no seu peito moram;
Manda prender ao réu austera a boca,
       Porém seus olhos choram.

Se à inocência denigre a vilania,
Que culpa aquele tem, que aplica a pena?
Não é o julgador, é o processo,
       E a lei quem nos condena.

Só no averno os juízes não recebem
Acusação, nem prova de outro humano,
Aqui todos confessam suas culpas,
       Não pode haver engano.

Eu vejo as fúrias afligindo aos tristes:
Chega uma o fogo e outra as serpes move;
Todos maldizem sim a sua estrela,
       Nem um acusa a Jove.

Eu também inda adoro ao grande chefe,
Bem que a prisão me dá, que eu não mereço;
Qual eu sou, minha bela, não me trata,
       Trata-me qual pareço.

Quem suspira, Marília, quando pune
Ao vassalo que julga delinquente,
Que gosto não terá, podendo dar-lhe
       As honras de inocente?

Tu vences, Barbacena, aos mesmos Titos
Nas sãs virtudes que no peito abrigas:
Não honras tão somente a quem premias,
       Honras a quem castigas.



Fonte: "Marília de Dirceu", Irmãos Garnier Editores, 1862.
Originalmente publicado em: "Marília de Dirceu", 1792.