Lira XXXV (parte II)

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Poema de Thomaz Antônio Gonzaga



Não hás de ter horror, minha Marília,
De tocar pulso, que sofreu os ferros?
Infames impostores m'os lançarão
       E não puníveis erros.

Esta mão, esta mão, que ré parece,
Ah não foi uma vez, não foi só uma
Que, em defesa dos bens que são do estado,
       Moveu a sábia pluma.

É certo, minha amada, sim é certo
Qu'eu aspirava a ser de um cetro o dono;
Mas este grande império que eu firmava
       Tinha em teu peito o trono.

As forças que se opunham não batiam
Da grossa peça e do mosquete os tiros;
Só eram minhas armas os soluços,
       Os rogos e os suspiros.

De cuidados, desvelos e finezas
Formava, ó minha bela, os meus guerreiros;
Não tinha no meu campo estranhas tropas;
       Que amor não quer parceiros.

Mas pode ainda vir um claro dia
Em que estas vis algemas, estes laços
Se mudem em prisões de alívios cheias
       Nos teus mimosos braços.

Vaidoso então direi: - Eu sou monarca;
Dou leis, que é mais, num coração divino;
Sólio que ergueu o gosto, e não a força,
       É que é de apreço digno.



Fonte: "Marília de Dirceu", Irmãos Garnier Editores, 1862.
Originalmente publicado em: "Marília de Dirceu", 1792.