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Poema de Ana Cristina César
Volta e meia vasculho esta sacola preta à cata de um três por quatro.
Exatamente o meu peito está superlotado.
Os ditos dele zumbem por detrás.
Na batida dou com figuras de outras dimensões.
Nesta hora grave a mais peituda, estirada no sofá,
encara fixamente a mulher da máquina.
(Junto a lista lacônica das férias: mudança,
aborto, briga rápida com A, tensão dramática
em SP, carta para B - pura negação -,
afasia com H, tarde sentida no Castelo).
Fotografar era pescar na margem relvada do rio.
Rigidez aguardando um clique. Um still.
Que morresse pela boca.
Nesta volta e meia vira e mexe acabo achando ouro na sacola.
Fabulosas iscas do futuro.
Helicóptero sobrevoando baixo o hospital do câncer.
Sorriso gabola da turma de 71.
Papai, mamãe, a linha do horizonte.
Concorde. Bonde do desejo. Espaçonave.
Hoje mesmo quando olhei para o rosto exausto de Angelita.
Desde que o Sombra me falou de amor.
Fonte: "Poética", editora Companhia das Letras, 2013.
Originalmente publicado em: "A Teus Pés", editora Brasiliense, 1982.
Fonte: "Poética", editora Companhia das Letras, 2013.
Originalmente publicado em: "A Teus Pés", editora Brasiliense, 1982.