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Imagem da poeta Beatriz Francisca de Assis

Poema de Beatriz Francisca de Assis



Amor é um prazer,
Amor é um tormento,
Dá vida em um momento,
Em outro faz morrer.

Seus mimos, seus agrados,
São cheios de veneno;
Por um prazer pequeno
Dá anos de cuidados.

Oh peitos, que inda isentos
Viveis do seu farpão;
Fugi da ingratidão
Aos tiros fraudulentos.

Promessas, prantos, votos,
São filhos da impostura,
Vária, falaz ternura
Os deixa logo rotos.

Já de meu terno pranto
Foi doce encanto amor;
Hoje trocado em dor
O tem de dor desfeito.

Quando do objecto amado
Os votos escutava,
Minh'alma se enlevava
Num gosto imaginado.

Eu era a sua vida,
Eu era o ídolo seu;
Como atestava o céu
Essa alma fementida!

Deposito inocente
De dolo e de impostura,
Que exprimes a ternura
De um ímpio que a não sente!

Que vezes, transportado
De gosto e de paixão,
Meu terno coração
Teve-te a si unido!

Que beijos, que carícias
Te prodiguei amante,
Julgando, delirante
Em ti minhas delicias!

Na pérfida expressão
De um'alma sem ternura,
Cevei minha loucura,
Nutri minha paixão.

Em cenas de prazer,
Em grata companhia,
Se o bárbaro não via,
Sentia-me morrer.

Num erro o mais agreste,
Num cerro desabrido,
Se o visse a mim unido,
Gozava um bem celeste!

Sim, pérfido, eu te amava
Mais do que a vida minha;
Prazer em ti só tinha,
Por ti só respirava.

Mas hoje te detesto;
Teus votos já não prezo;
Desprezo, e só desprezo
Te juro, te protesto.

Foge, infiel, traidor,
De ingratidão exemplo;
Que indigno te contemplo
Até do meu rancor.



Fonte: "Cantos da Mocidade", Casa Imperial, 1856.
Originalmente publicado em: "Cantos da Mocidade", Casa Imperial, 1856.