Crônica

Imagem de Mário Quintana

Poema de Mario Quintana


Sia Rosaura tirava a dentadura para comer
Por isso ela tinha o sorriso postiço mais sincero da minha rua
Dona Maruca fazia uns biscoitinhos minúsculos, estalantes e secos chamados mentirinhas
Eduviges era pálida e lia romances lacrimosos de Perez Escrich
Tanto suspirou em cima deles que acabou fugindo com um caixeiro-viajante
O tempo se desenrolava como um rio por entre as casas de porta e janela
               Pequenas vidas
               Pequenos sonhos
Na noite imensa as estrelas eram como girândolas brancas que houvessem parado
Sentados à porta
- dois santos, dois mágicos, dois sábios -
meu velho Tio Libório e o velho farmacêutico
propunham-se e compunham charadas
que depois orgulhosamente remetiam sob nomes supostos
para o grande anuário estatístico recreativo e literário da capital do Estado.



Fonte: "Quintana de Bolso", Editora L&PM Pocket, 2007.
Originalmente publicado em: "Esconderijos do tempo", 1980.