O fogo no canavial
Poema de João Cabral de Melo Neto
A imagem mais viva do inferno.
Eis o fogo em todos seus vícios:
eia a ópera, o ódio, o energúmeno,
a voz rouca de fera em cio.
E contagioso, como outrora
foi, e hoje não é mais, o inferno:
ele se catapulta, exporta,
em brulotes de curso aéreo,
em petardos que se disparam
sem pontaria, intransitivos;
mas que queimada a palha dormem,
bêbados, curtindo seu litro.
(O inferno foi fogo de vista,
ou de palha, queimou as saias:
deixou nua a perna da cana,
despiu-a, mas sem deflorá-la.)
Fonte: "A educação pela pedra e depois", Editora Nova Fronteira, 1997.
Originalmente publicado em: "A escola das facas", 1980.