*

Imagem de Manoel de Barros

Poema de Manoel de Barros



Um sujeito mancava de madeira.
Seu manco era oblíquo.
Sua boca atingia o canto.
Para avançar no poente, ele tinha que atravessar
o rio.
O rio dobrava uma pedra para ele passar; mas
ele não dobrava a sua perna para passar o rio.
De forma que nós, do barranco, ficávamos, de
um modo ascoso, esperando.
Era preciso amarrar uma corda na cintura do
homem e depois puxar.
O homem atravessava o rio como um peixe
fisgado pelo meio.
Poucos entendiam quase nada; mas eu entendia
um pouco menos.
(É assim. Restolho, de primeiro, não passava de
restos de uma erva seca; depois o restolho se
tornaria a imagem de um pobre homem à beira
de um ralo.)
Esse manco era um pobre homem à beira de um
ralo.



Fonte: "Poesia Completa", Editora Leya, 2010.
Originalmente publicado em: "Concerto a Céu Aberto para Solos de Aves", 1989.