Noturno III
Poema de Mario Quintana
Os cuidados se foram, ou tomaram
Estranhas máscaras de sonho...
Teus cabelos de náufrago
Estão bordados no brancor da fronha.
E onde foste arranjar essas mãos de cera
Que parecem levemente luminosas no escuro?
Toda a casa encalhou nalgum ponto noturno:
Ninguém no cais do deserto...
Apagaram-se os grilos,
As estrelas estão imóveis e tristes como num mapa sideral.
Nunca estiveram também tão fixos os olhos dos retratos,
Como se fossem apenas fotografias.
O único rumor de vida,
Esse vem de muito, muito longe: o pobre arroio antigo
Gota a gota a fluir no soluço da pia!
Fonte: "Quintana de Bolso", Editora L&PM Pocket, 2007.
Originalmente publicado em: "Apontamentos de história sobrenatural", 1976.