minifesto
Poema de Paulo Leminski
ave a raiva desta noite
a baita lasca fúria abrupta
louca besta vaca solta
ruiva luz que contra o dia
tanto e tarde madrugastes
morra a calma desta tarde
morra em ouro
enfim, mais seda
a morte, essa fraude,
quando próspera
viva e morra sobretudo
este dia, metal vil,
surdo, cego e mudo,
nele tudo foi e, se ser foi tudo,
já nem tudo nem sei
se vai saber a primavera
ou se um dia saberei
que nem eu saber nem ser nem era
Vim pelo caminho difícil,
a linha que nunca termina,
a linha bate na pedra,
a palavra quebra uma esquina,
mínima linha vazia,
a linha, uma vida inteira,
palavra, palavra minha.
Fonte: "Toda Poesia", Editora Companhia das Letras, 2013.
Originalmente publicado em: "distraídos venceremos", 1987.