Noite
Poema de Cecília Meireles
Úmido gosto de terra,
cheiro de pedra lavada,
- tempo inseguro do tempo! -
sombra do flanco da serra,
nua e fria, sem mais nada.
Brilho de areias pisadas,
sabor de folhas mordidas,
- lábio da voz sem ventura! -
suspiro das madrugadas
sem coisas acontecidas.
A noite abria a frescura
dos campos todos molhados,
- sozinha, com o seu perfume! -
preparando a flor mais pura
com ares de todos os lados.
Bem que a vida estava quieta.
Mas passava o pensamento...
- de onde vinha aquela música?
E era uma nuvem repleta,
entre as estrelas e o vento.
Fonte: "Antologia Poética", Editora do Autor, terceira edição, 1966.
Originalmente publicado em: "Viagem", 1939.